terça-feira, 1 de abril de 2008

LITANIA DOS POBRES

Os miseráveis, os rotosSão as flores dos esgotos.
São espectros implacáveisOs rotos, os miseráveis.
São prantos negros de furnasCaladas, mudas, soturnas.
São os grandes visionáriosDos abismos tumultuários.
As sombras das sombras mortas,Cegos a tatear nas portas.
Procurando o céu, aflitosE varando o céu de gritos.
Faróis à noite apagadosPor ventos desesperados.
Inúteis, cansados braçosPedindo amor aos espaços.
Mãos inquietas, estendidasAo vão deserto das vidas.
Figuras que o Santo OfícioCondena a feroz suplício.
Arcas soltas ao nevoentoDilúvio do esquecimento.
Perdidas na correntezaDas culpas da natureza.
Ò pobres ! Soluços feitosDos pecados imperfeitos !
Arrancadas amarguras Do fundo das sepulturas.
Imagens dos deletériosImponderáveis mistérios.
Bandeiras rotas, sem nome,Das barricadas da fome.
Bandeiras estraçalhadasDas sangrentas barricadas.
Fantasmas vãos, sibilinosDa caverna dos destinos !
Ò pobres ! O vosso bandoÉ tremendo, é formidando !
Ele já marcha crescendo,O vosso bando tremendo...
Ele marcha por colinas,Por montes e por campinas.
Nos areais e nas serrasEm hostes como as de guerras.
Cerradas legiões estranhasA subir, descer montanhas.
Como avalanches terríveisEnchendo plagas incríveis.
Atravessa já os mares,Com aspectos singulares.
Perde-se além nas distânciasA caravana das ânsias.
Perde-se além na poeira,Das esferas na cegueira.
Vai enchendo o estranho mundo Com o seu soluçar profundo.
Como torres formidandasDe torturas miserandas.
E de tal forma no imensoMundo ele se torna denso.
E de tal forma se arrasta Por toda a região mais vasta.
E de tal forma um encanto Secreto vos veste tanto.
E de tal forma já cresceO bando, que em vós parece,
Ó pobres de ocultas chagasLá das longínquas plagas !
Parece que em vós há sonhoE o vosso bando é risonho.
Que através das rotas vestesTrazeis delícias celestes.
Que as vossas bocas, de um vinhoPrelibam todo o carinho...
Que os vossos olhos sombriosTrazem raros amavios.
Que as vossas almas trevosas Vêm cheias de odor das rosas.
De torpores, de indolênciasE graças e quintessências.
Que já livres de martírios Vêm festonadas de lírios.
Vêm nimbadas de magia,De morna melancolia !
Que essas flageladas almasReverdecem como palmas.
Balanceadas no letargoDos sopros que vêm do largo...
Radiantes de ilusionismos,Segredos, orientalismos.
Que como em águas de lagosBóiam nelas cisnes vagos...
Que essas cabeças errantesTrazem louros verdejantes.
E a languidez fugitiva De alguma esperança viva.
Que trazeis magos aspeitosE o vosso bando é de eleitos.
Que vestes a pompa ardenteDo velho sonho dolente.
Que por entre os estertoresSois uns belos sonhadores.

Nenhum comentário: